terça-feira, 28 de outubro de 2014

Café sem açucar e um casal de lésbicas

Existe uma história que o Zizek gosta de contar nas suas palestras e livros que é mais ou menos assim: "Certa vez um homem veio a uma cafeteria e pediu para o garçom um café sem açúcar. Meio sem jeito o garçom respondeu. Desculpe senhor, mas hoje não temos açúcar, posso oferecer-lhe um café sem leite?" Essa é uma das histórias que o Zizek conta pra tentar ilustrar alguma coisa sobre a psicologia humana, sobre o comportamento humano. No caso dessa história, por exemplo, ele tenta evocar alguma coisa que o Lacan disse sobre o fato de que aquilo que você obtém não ser constituído apenas pelo que você de fato obtém, mas também por aquilo que está ausente na presença do objeto obtido. A questão aqui é que, ao contrário de algumas outras histórias que o Zizek conta, essa especificamente eu achei um pouco difícil de imediatamente associar a alguma coisa mais diretamente compreensível. Bom, eu sei lá, eu nunca li nada do Lacan, o que talvez ajudasse nesse caso. Mas mesmo assim. Enfim, a questão ficou resolvida só algum tempo depois quando eu estava lendo uma reportagem sobre um protesto que tava tendo na frança a favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Bom nessa reportagem o jornalista tinha entrevistado uma menina que estava lá com a namorada e o que a menina tinha dito era mais ou menos assim: "Eu sou fundamentalmente contra a instituição casamento pois acredito no amor livre como a única forma de amor. Obviamente nós não casaremos mesmo que a lei passe a permitir isso. Porém, para mim é importantíssimo e estou aqui lutando para que a lei aceite o casamento entre pessoas do mesmo sexo, pois eu gostaria de não me casar por opção e não por impossibilidade." Então, eu sei lá se o que o Zizek quis dizer foi algo desse tipo, mas essa fala dessa menina descreveu perfeitamente a situação para mim. A coisa em si que ela teria nos dois casos é a mesma. Um não casamento. Mas não importa apenas isso. A condição na qual está situada o não casamento, mesmo que não altere ele em si, muda efetivamente o que significa o não-casar. Enfim, é mais ou menos isso. Uma outra coisa parecida é por exemplo quando se fala em amor livre, ou poliamor que tem sido o termo mais usado hoje em dia. Por exemplo, existe gente que defende o poliamor mas que mesmo assim acaba vivendo em uma relação monogâmica, o que não é nenhuma contradição. É o simples fato de ver que ter uma relação monogâmica estritamente por que é isso que realmente se quer, não é o mesmo do que ter uma relação monogâmica por imposição de uma moral dos bons costumes. Definitivamente não é o mesmo. 

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Zizek e o comunismo

Então, comunismo é um negócio que dá um trabalhão falar alguma coisa sobre ele. Por causa das experiências comunistas mesmo. Deram um problemão. Mas é um dos temas que me interessam muito. O que dá pra ser salvo dali? E como formular o que deu errado de maneira correta sem cair nesses lugares comuns? Bom, nem sempre lugares comuns são ruins, mas em alguns casos eles escondem violências, inconsciências e deturpações piores do que as quais eles querem combater. O problema não é simples. Nem um pouco. Mas enfim, estou pensando em escrever algumas coisas sobre isso daqui pra frente. Na verdade eu quero escrever sobre outras coisas também. Sobre espíritos e sobre o mundo espiritual. Nada a ver, né? Mas enfim, são duas coisas que me interessam mesmo que a principio não pareçam estar tão ligadas assim. Mas não faz diferença. Enfim, só pra exemplificar, um dos pensadores que foi um dos únicos que conseguiu me dar uma visão que eu gostei do comunismo foi o Zizek. Slavoj Zizek. É um esloveno que escreve um montão de livros por aí, sobre diversas coisas. Psicanalise, filosofia, cinema, comunismo, política e por aí vai. Ele é formado em psicologia e em filosofia. E acho que tem doutorado em filosofia se não me engano. Eu gosto muito dele. Mas enfim, vou deixar aqui a tradução de um pedaço de uma das falas dele que eu vi esses dias e que gostei bastante. Só pra compartilhar mesmo. Lá vai:

"Talvez devêssemos estar cansados dessa mobilização capitalista total. Você sabe que você tem que ser ativo o tempo todo, e assim por diante. Talvez esta seja a causa última, uma das causas da nossa crise - o nosso próprio dinamismo. Como a única maneira de sobreviver é se revolucionar o tempo todo e assim por diante. Eu acho que se você olhar para as civilizações passadas, os verdadeiros grandes homens passaram sobre essa obsessão: sempre auto-revolucionar-se. Para mim, eles eram uma coisa, eu não diria que boa, mas satisfatoriamente utópica em um bom sentido. Nesta ideia: "Meu Deus, não vivemos nesta terra para trabalhar duro e apenas fazê-lo cada vez melhor. Nós apenas deveríamos pegar leve um pouco." E você sabe, lamento dizer-lhe, isto é claramente parte do meu conceito de comunismo."

Bom isso nem é parte central do pensamento do Zizek. É uma coisa bem periférica pra ser sincero. Mas é que que simplesmente eu vi e achei legal. Então resolvi colocar aqui. Tudo bem?

Até

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Onde fica a direita?

Estava aqui pensando um pouco sobre possíveis consequências de uma possível eleição da Marina para presidência da república, e acabei me deparando com um cenário que eu nunca havia examinado. Bom, na verdade só pra me situar rapidamente eu sou, dentro de alguns limites, bem de esquerda, variando as vezes entre e anarquismo e o comunismo, mas sendo muitas vezes também um pouco contraditório com os dois. Enfim, deixa pra lá, o importante aqui é que em termos de política brasileira eu tendo normalmente a votar por partidos bem de esquerda como o PSOL ou o PSTU, isso quando eu não anulo o voto. Acabo votando em partidos como o PT quase exclusivamente só quando tem segundo turno mesmo. Pois por mais que tenha muita coisa no PT que me desanima, eu obviamente ainda considero e admito que exista uma distância enorme entre eles e partidos por exemplo como o PSDB, que por sinal eu considero a escória da humanidade e a representação mais baixa de onde pode chegar o ser humano (tá bom isso é muito exagero, é claro que dá pra ir bem mais baixo do que isso, mas enfim). Bom, mas pra que eu to falando disso? A questão é que durante esses 12 anos de governo do PT eu acabei de certa forma ficando um pouco que forçadamente afastado do debate político. Mas porquê? O que aconteceu é que sendo sincero com o que eu acredito, eu não podia de maneira nenhuma apoiar certas coisas do PT, principalmente essa politicagem chata de ficar apoiando e recebendo apoio de gente que sempre criticou, essa troca de favores com outros partidos fornecendo ministérios, a questão de beneficiar certas empreiteiras e fazer esse joguinho neoliberal com eles, emfim, basicamente por manter um montão da estrutura política, que levou e sempre leva inevitavelmente à corrupção, e também muito da lógica neoliberal de submissão a certas empresas e bancos. Tipo, eu até entendo eles fazerem certas concessões para parecerem mais legais para poder chegar e se manter no poder, mas eu também me dou todo o direito de não compactuar com isso. Mas enfim, porque então eu não simplesmente virei oposição e pronto? Essa é a questão fundamental que me faz pensar o que será do cenário político do país com a Marina no poder. Bom, o que aconteceu foi que no fim das contas eu nunca consegui fazer oposição direito ao PT. Não dava por um simples motivo. Se o meu grito ajudasse a enfraquecer o PT, certamente a voz que surgiria para ocupar o lugar deles, não seria a minha, seria a da direita. Se por um acaso o Lula caísse e o PT saísse, quem viria seria quase que inevitavelmente alguém da linha do PSDB, um Serra, Alckmin ou sei lá, algo do tipo. E isso eu não queria por nada nesse mundo. Pois por mais que eu tivesse as minhas broncas com o PT eu claramente via e apoiava muitos avanços do seu governo, como programas como o Bolsa família, as políticas de cotas, as lutas dos LGBTs (mesmo que devagar e parcialmente), política externa mais amigável com vizinhos e menos submissas a certas "super-potências", que levaram a conquistas sociais, como queda do desemprego, e diminuição da miséria como nunca houve, que neoliberais não só não conseguiriam fazer como escutando atentamente a qualquer discurso de um deles se percebe que no fundo nem gostariam de verdade que acontecesse. Enfim, por essas coisas acabei durante esses 12 anos não só não fazendo a oposição que eu gostaria de ter feito, como por muitas vezes acabei inclusive indo pro lado deles para defender o que era correto de ataques injustos vindos da direita. Foi um pouco estranho pois o próprio resultado de defender o PT contra a direita, de certa forma diminuiu e muito a força do meu discurso de esquerda, pois como a batalha política estava se dando acabou acontecendo que simplesmente eu não consegui achar nenhum lugar para situá-lo. Eu não podia usá-lo como oposição, tipo, oposição ideológica é claro que dava, e sempre deu, mas na hora de levar isso a um ativismo mais prático não dava mesmo pelo medo de fortalecer o discurso da direita. E também não cabia esse meu discurso na defesa do PT pois os dois eram por muitas vezes incompatíveis. Emfim, fiquei mais ou menos sem lugar na política. E isso dá pra ver não apenas comigo, pois na primeira eleição presidencial que o PSOL participou a Heloísa Helena teve quase uns 7% dos votos, e depois disso o PSOL só vem caindo. O Plínio teve pouco mais de 1% se não me engano e agora a Luciana Genro não chega nem a isso. Sendo que não houve nenhum aumente de votos para outros partidos também de esquerda como o PSTU ou o PCO. Ou seja, a esquerda ficou mesmo sem lugar. Sem muita esperança de realmente realizar um pouco de suas idéias. Mas então, e a Marina? Bom, no caso da Marina de certa forma eu sinto que poderei voltar ao cenário político. Pelo simples fato de que eu sei que se ela cair e sair fora depois, muito adoravelmente quem volta é o PT ou algo do tipo. Então dá pra ser oposição sem medo. Numa boa. E quem sabe com isso a esquerda não cresça um pouquinho outra vez? Enfim sei lá. Não dá pra prever esse tipo de coisa eu acho. Mas enfim, a questão interessante mesmo é pensar aqui o que será da direita durante o governo da Marina. O engraçado é que se a Marina ganhar, ela ganhará basicamente por esse discurso do "anti-petismo" (cara, eu odeio a palavra petismo, serio mesmo, que merda é essa, petismo?), esse discurso do vamos tirar o PT do poder. Mas essa é justamente a questão. A Marina por mais que ela seja uma aberração política, tentando combinar direita com esquerda e achando que está sendo super moderna ao fazer isso, ela claramente vai manter algumas coisas na área social como bolsa família e ela não é exatamente o que uma pessoa de direita acredita ser correto. Ela tem suas semelhanças mas está longe de ser um Aécio Neves da vida. O que eu vejo aqui que vai acontecer é que se ela for eleita quem ficará sem lugar nenhum na política será justamente a direita. É, a direita mesmo. Porque olha bem. Se eles fizerem oposição a Marina, cara na boa, quem volta é o Lula, ou alguém do tipo. O PSDB tá sem força nenhuma. Não vai pela primeira vez em décadas nem ir para o segundo turno. Tipo, como eles ficarão em relação a Marina? Eles não terão lugar nenhum pra ficar. Será igual eu e a esquerda em relação ao PT. Certamente oposição clara eles se darão conta que não poderão fazer, pois se ela cair, eles sabem que quem voltará será o PT. E também não poderão ser posição propriamente dito pois, farão o que, vão apoiar o bolsa família agora? A política de cotas? Enfim, é ver pra crer. Mas acho que finalmente a direita vai perder a sua capacidade inclusive de se formular como direita. Vai ser forçadamente excluída do debate político por si mesma e pela sua insistência cega em ser anti-PT à qualquer custo. Eles estão achando que estão dando uma cartada de mestre ao tirar a Dilma do poder, mas no fim acho que estão dando um tiro não no próprio pé, mas um tiro na própria cabeça. Sei lá, quero ver o que vai acontecer. Se eles vão criticar a Marina e ajudar o PT a voltar ou se pra defendê-la irão apoiar programas do PT que sempre criticaram. Se isso é bom ou ruim, sinceramente não sei. É claro que ver a direita sem poder político por um lado é uma coisa boa, mas por outro que tipo de radicalização pode surgir de uma direita impotente e ressentida vai saber. Bom, vamos ver. Agora é dar tempo ao tempo pra ver o que passa.

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Ouro não é como a prata porque a prata...

Lembro de uma vez a uns 10 anos um professor de química que eu tive que na primeira aula do curso começou a contar um caso para exemplificar para os alunos como não responder as questões da suas provas. Ele contou que uma vez ele havia colocado na prova uma questão do tipo "Discuta em 10 linhas tudo o que você sabe a respeito do ouro". E um dos alunos que não sabia muita coisa sobre o ouro, mas que por acaso sabia bem mais sobre a prata respondeu a questão da seguinte forma: "O ouro não é como a prata, pois a prata é assim, assim, e assim..." E assim se foram 10 linhas com explicações sobre a prata. Enfim, provavelmente a história que ele contou nem era verdadeira, ele obviamente fez isso apenas para exemplificar o que queria. Bom, mas porque estou aqui contando isso? A questão é que estamos em período eleitoral para escolher o próximo presidente aqui do Brasil que ficará lá pelo menos durante 4 anos, e uma das coisas que eu tenho notado é que dessa vez mais do que nunca, o debate tem acontecido exatamente como esse caso que o meu professor de química havia contado a 10 anos. Há inclusive colunistas de certas revistas que abertamente declaram que vão votar em tal candidata (nesse caso o nome dela é Marina), simplesmente porque ela não é como a outra candidata (nesse caso o nome dela é Dilma), pois a Dilma é isso, isso e aquilo. Tipo, isso sempre mais ou menos aconteceu, só que dessa vez isso tomou proporções bem maiores do que antes. Votam em massa na Marina, pois ela não é a Dilma e a Dilma é assim, assim e assim. Bom, mas porque estou falando isso aqui. É claro que cada um vota em quem quiser e pela razão que quiser. E a Marina é capaz até mesmo de ganhar a eleição. O que me incomoda um pouco é simplesmente que a nossa democracia tenha chegado a esse ponto. Alguém ganha a eleição por ser um não-outro, só que essa pessoa governará não como sendo uma não-Dilma, mas sim como sendo a Marina. Uma presidente que provavelmente ninguém quer por ser quem ela é, mas sim por quem ela não é. Sei lá, eu acho isso bizarro. Eleger e ser governado por alguém que ninguém no fundo quer. Vai lá, é claro que as pessoas tem o direito de votar assim e escolher assim, mas me preocupa um pouco que a gente tenha chegado a essa situação. Sei lá, nem sei direito se tenho solução pra isso, ou um modelo melhor de democracia. Mas isso aqui virou uma maluquice só. Acho que vale a pena dar um passo atrás um pouco, pra pensar melhor sobre realmente qual é a democracia que a gente quer. Ou então pra entender melhor o que realmente está acontecendo.