quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Carta para a humanidade


Ó minha querida humanidade, meus queridos seres humanos, seres que na maioria dos vezes os odeio, seres que não me deixam em paz, que querem me transformar em uma cópia, em uma ovelha. Hoje eu vos falo do fundo do meu coração, apesar de tudo eu gosto de vocês. Apesar da insuportável mediocridade que se fantasia de prepotência, da covardia que acredita ser sensatez, do egoísmo injustamente condenado a repreensão, apesar disso tudo hoje eu amo vocês.

Há algo nos seres humanos que é divino. Algo que não tem nada a ver com esse Deus criado pela fantasia e pelo medo da vida que as pessoas tem, mas algo divinamente humano, ou humanamente divino, algo que os homens insistem em tampar os olhos para não ver. Algo que não transformaria os humanos em santos em hipótese nenhuma, é algo que só consegue ver a pessoa que olha para si mesma como é, como um humano cheio de defeitos, cheio de incertezas, cheio de desejos, um humano com ânsia de viver humanamente. Esse ser encontra esse algo, e é por causa dele que hoje eu escrevo à todos vocês.

Esses humanos não foram criados especiais, na verdade eles não tem nada de incomum, pois são apenas humanos, assim como vocês. A diferença é que ele consegue se ver, já vocês não sabem quem são. Quando vocês escolheram virar santos, quando quiseram tomar a estrada da perfeição, vocês se perderam, vocês nunca mais conseguiram se olhar em um espelho, vocês passaram a ter nojo do que há de mais nobre e bonito em vocês que é a humanidade intrínseca a sua existência. Vocês viraram ao avesso, são humanos ao contrário, são sofredores que vagam no mundo tendo que carregar o fardo que é a vida.

Mas vos direi a verdade, mesmo a vocês eu os amo, mesmo aos cegos da alma eu os amo, pois mesmo que vocês estejam com os olhos fechados sem querer enxergar nada além do seu Deus tirano, o universo clama pela suas existências. Quando vocês choram todo o cosmos chora com vocês, quando vocês se reprimem todo o universo se reprime com vocês, quando vocês escolhem não mais se conhecerem o universo passa também a não mais saber quem é. E é por isso que estou aqui hoje, para pedir que vocês abram os olhos e vejam quem vocês são, não se culpem por serem humanos pois é exatamente isso que os tornam divinos, não tenham medo de dançar porque quando vocês dançam o universo inteiro entra no ritmo de suas músicas, quando vocês riem a natureza toda dá gargalhadas ao mesmo instante. Não tenham medo do desconhecido, pois apenas o que é desconhecido é que serve para manter a beleza da vida. Sintam gosto pelo incerto, pois a certeza os tornam feios. Não acreditem em nada, experimentem tudo, experimentem a vida que está aí fora aguardando por vocês. Não combatam o ser humano lindo que há dentro de vocês louco para finalmente ser humano sem se sentir culpado por isso. Amem a vocês mesmos, exatamente do jeito que vocês são e subitamente vocês verão que todo o universo os ama do mesmo jeito, na verdade ele sempre os amou assim, vocês é que não queriam ver. O universo nunca os julgou, ele nunca apontou o dedo para a cara de vocês, ele nunca criou nenhuma moral, isso tudo foi obra dos cegos de espírito.

Mas os tempos em breve serão outros, finalmente não será mais época de Santos, talvez até mesmo Deus possa finalmente ser esquecido e sumir de vez da cabeça das pessoas, finalmente talvez o ser humano consiga olhar para si mesmo sem máscaras e ver a verdade que sempre esteve nele, a beleza que sempre esteve nele, a sua humanidade reprimida. Talvez o ser humano possa enfim se tornar o Deus de sua própria vida, o dono de sua própria moral e o criador de sua própria verdade.